Compositor: Luis Gaieta
Escrevi e plantei
Dei a luz milhões vidas
Das quedas que levantei
Sarei-me das minhas feridas
E se não fosse eu
Ainda assim seria muntu
Fiz-me trevas, fiz-me breu
Nisso vive ubuntu
É vinho da uva
Da videira da utopia
Onde nada é vão
Porque tudo lá é Sol
Eu vinha da chuva
Que a treva cuspia
Coberto de trovão
E o amarelo do arrebol
Descalço de tabus
Despi etiquetas
Perdi a lucidez
Fiz-me natureza
Eu fiz-me luz
Nas profundas gretas
Bebi da nudez
Tornei-me pureza
Óh vida, me desata
Deixa-me ser kandengue
Me faz um afrocrata
Como o grande simão bengui
Se tudo aqui é vento
Não passamos de sopro
Que não morre, que não some
Se converte a vapor
Na pedra do alento
Falhei como escopro
Tudo corre e me carcome
Tudo faz-me decompor
Se o mundo não existe
E for só coisa da cabeça
Todo feliz é triste
Todo ruido é conversa
A verdade engasga
Pois, a língua peca
O tempo corre
Não há nada que se queixa
Se o livro rasga
A árvore seca
O homem morre
Não há nada que se deixa
Se o mundo fosse um deserto
Que grão de areia seria
Que seria decerto
Longe dessa calmaria
A vida é tempestade
Para quem não faz escolha certa
Quem rouba o pergaminho
Mas não sabe o que escrever
A vida é sempre tarde
Para quem não crê na colheita
Quem sabe do caminho
Mas, não trilha no dever
Vi grandiosidade
Na minha pequenez
Mas, nada me descreve
Vida já não tem lembrança
Vi minha deidade
Se tornando soez
Porque a reza entrou em greve
E o amor perdeu a graça
Olhos calados
Para não verem o sofrimento
Se evitam do tormento
Do desamor dessa lar
Braços calejados
Choram pela esgotamento
Lamentam do aumento
Do preço de respirar
Se o mundo não existe
E for só coisa da cabeça
Aqui nada consiste
Tudo passa de crença
A verdade engasga
Pois, a língua peca
O tempo corre
Não há nada que se queixa
Se o livro rasga
A árvore seca
O homem morre
Não há nada que se deixa